Reflexão para domingo, 25 de fevereiro de 2024

Transfiguração de Rafael Sanzio (1483–1520)

Quantas vezes, nas suas peregrinações, o jovem carpinteiro Jesus teve que vivenciar profunda impotência e sofrimento pelo fato de a humanidade, nem mesmo nos altares, conseguir se ligar aos seres divinos, à sua fonte de vida primordial. A humanidade havia sido abandonada às forças demoníacas. Em consequência, muitas doenças de corpo e alma se alastraram rapidamente. Isso também em muitos aspectos resultou no declínio da cultura e da civilização. Essa tendência ainda não foi revertida completamente.

Uma reviravolta, no entanto, aconteceu com o batismo no Jordão. O Espírito de Cristo desceu dos céus e penetrou na natureza terrena de Jesus, o conduziu primeiro ao deserto. Lá, Jesus Cristo vivenciou em si mesmo até que ponto os seres adversários tentavam com suas cadeias aprisionar a humanidade para seus fins. Mas, pela tentação, Cristo aprendeu a reconhecer e vencer o mal na natureza humana. Assim foi transformando e elevando a natureza terrena de Jesus para a salvação da humanidade. A partir deste centro forma-se o círculo de discípulos. O poder transformador e sanador de Cristo começa a se irradiar pela humanidade, pelo mundo.

Jesus Cristo subia frequentemente às montanhas para elevar cada vez mais a sua própria transitória natureza humana. Levava os discípulos como testemunhas dessa transformação. Assim, os seus discípulos se capacitavam a apoiar e cumprir a sua missão. Descendo da montanha, Jesus Cristo continuava sua obra de sacrifício e amor até a realização total de sua missão: a sua morte na cruz e a sua ressurreição.

O que em Jesus Cristo se torna um fato, uma vitória espiritual na Terra – como a transfiguração e mais tarde a ressurreição – vem também enriquecer a natureza espiritual humana com novas qualidades eternas, indispensáveis para o desenvolvimento futuro da humanidade. Do declínio e decadência espiritual abre-se uma nova perspectiva para a prometedora evolução humana. À alma humana é concedida para sempre a condição interior para servir o espírito em liberdade. Essa condição interior para realizar a obra de Deus em liberdade reside no EU SOU. O EU SOU é o Senhor da alma, une as forças da alma para um propósito elevado.

Hoje, as três forças da alma (pensar, sentir e querer) tornaram-se independentes umas das outras, desagregando-se de modo caótico. O que hoje uma pessoa pensa, raramente corresponde às suas ações; seus sentimentos se enrijeceram, tornaram-se indiferentes, sua vontade encontra-se paralisada e impotente. Essa é a causa de muitos males atuais. No entanto, podemos contar com o poder unificador e ordenador do Cristo. Sim, o profundo anseio das três testemunhas da transfiguração foi cumprido. A humanidade construiu três tendas no local onde se manifesta a revelação do Cristo.

Quando realizamos o Ato de Consagração do Homem, elevamos o olhar para o altar e vemos ao fundo a imagem da transfiguração brilhar. Transluzindo através do sacerdote e dos dois ministrantes, vemos o Redentor atuando junto com Moisés e Elias, seus precursores na formação de comunidades espirituais. Tomamos a poção de saúde que harmoniza as forças da nossa alma e lhes confere a paz. No final, quando o sacerdote desce os degraus da altura luminosa do altar, nós o seguimos. Fortalecidos e encorajados por Cristo, continuamos a sua obra redentora na vida quotidiana, no mundo.

Naquela época, Jesus Cristo conseguiu curar um epiléptico quando depois da transfiguração desceu de volta para o sopé da montanha. Até então, todos os intuitos dos discípulos de curar aquele jovem haviam fracassado. Também nós podemos crescer em força e confiança interior pela vivência cúltica do sacrifício de Cristo pela humanidade. Como seus seguidores poderemos de forma cada vez mais eficaz reverter o declínio e decadência da humanidade para a sua ascensão ao espírito. Fortalecidos pelo Cristo podemos encarar o processo da Paixão na humanidade e no destino individual com coragem e confiança.

Helena Otterspeer

Reflexão para domingo, 11 de fevereiro de 2024

Referente à perícope do Evangelho de Lucas 18:18-34

Kierkegaard dizia que a pureza do coração pode ser alcançada quando a pessoa passa a querer uma única coisa: a união com o Pai eterno. A síntese de todos os propósitos numa única direção, num único anelo, elimina a distração, a confusão e o desnorteamento, permitindo ao indivíduo clareza e força em seu caminho de retorno à sua fonte primordial. Ora, esse é exatamente o conselho que Jesus dá ao jovem rico. Este seguia os mandamentos, mas é interessante que os mandamentos citados não mencionam o mais essencial: amar a Deus acima de todas as coisas. 

Jesus percebeu que o que lhe faltava era abandonar seu ídolo maior: o dinheiro, a riqueza, a fama. Essa admoestação não se aplica somente aos ricos de dinheiro. De alguma forma, todos nós somos ricos conforme os ídolos que escolhemos. E nossos tempos nos dão uma profusão de ídolos, a avalanche de informação, de distração. Os meios sofisticados de comunicação, hoje acessível a praticamente todos, ao mesmo tempo em que nos permitem acesso ao que supostamente seria de nosso interesse, cria interesses, desejos e até necessidades, adições. Não se trata de tomar literalmente o conselho: “Vende tudo o que tem”. 

Na verdade, o conselho poderia ser simplificado num chamado a nos darmos conta do que de fato necessitamos e buscarmos no íntimo da alma nosso bem mais precioso: a essência de nós mesmos. Vamos perceber que nossa individualidade sagrada não necessita de todas essas coisas que abundantemente nos cerca, mas necessita, na verdade, que lapidemos nossa vontade para aprender a ver e querer o essencial, sem o qual toda a riqueza do mundo não vale absolutamente nada. 

Carlos Maranhão

Reflexão para o domingo, 4 de fevereiro de 2024

Referente ao perícope do Evangelho de Mateus 20, 1-16

Todos nós somos chamados para trabalhar no mundo, na vinha do Senhor. Recebemos a chamada em momentos diferentes e o trabalho de cada um tem sua própria duração. Por isso, não nos ajuda nos comparamos com as outras pessoas que trabalham conosco.

No final do dia, no final da vida, cada um recebe o que tinha combinado com o Senhor da vinha antes de ir para o trabalho. Todos receberão o mesmo? Provavelmente não. Ainda menos se olhamos para as realidades do mundo. Cada um recebe o que necessita para continuar o seu caminho. Essas necessidades são diferentes entre as pessoas. Podemos ter a certeza de que recebemos o que precisamos para o nosso caminho de desenvolvimento e para poder continuar a trabalhar na vinha do Senhor.

Julian Rögge

Reflexão para segunda-feira, 25 de dezembro de 2023

Frade Francke, 1425

Todo ano jorra na noite de Natal a plenitude de vida e luz, que tocou a Terra pela primeira vez na virada dos tempos! Nessa imagem acima do Natal

Primordial, a escuridão da noite, que não revela os seus mistérios aos sentidos humanos, transforma-se em decidida vontade do mundo divino de se revelar à humanidade na Terra. O azul escuro da noite se transforma no vermelho irradiante da manifestação da vontade divina. Em outras palavras, o Pai, através de Maria, envia seu Filho para o lugar de pobreza do espírito, a Terra. Maria, representando idealmente todas as almas humanas, portanto, em sua própria essência completamente devotada ao espírito, torna-se nesse momento um instrumento da vontade divina, irradia a luz divina do seu interior. Seu manto azul escuro cai como um véu, e sua roupa é luz, a luz divina.

A pura criança divina não encontra uma casa, uma morada apropriada para a sua natureza divina. Desde então, cada um de nós pode se esforçar em preparar essa morada no seu coração. Pela ressurreição essa fonte inesgotável do Natal primordial se ligou primeiramente à alma humana nos encontros de Jesus Cristo com os discípulos e mais tarde a todo o planeta Terra pela ascensão do ressuscitado aos céus. Os ciclos de vida da Terra se tornaram os ciclos de vida do Redentor. Sua respiração se tornou o respirar da atmosfera da Terra nas estações do ano. A humanidade vive e respira com e no seu Corpo-Espírito. O primeiro Natal do mundo ficou gravado na Terra e na sua atmosfera e todo ano volta a acontecer.

Outrora a natureza acolheu a vinda da palavra divina primordial no anseio por se liberar da prisão e do peso da matéria pela prometida redenção de toda criatura. Uma luz natalina se espalhou por toda a natureza e os pastores, que conviviam estreitamente com seus ritmos, receberam a mensagem do mundo divino, anunciada pelos anjos. Essa mensagem aqueceu seus corações e eles se puseram a caminho para encontrar a criança divina, a adorarem e oferecer suas dádivas a ela.

Desde então, o coração humano foi se endurecendo cada vez mais com o passar dos séculos e com a ascensão do materialismo. Mas também a mensagem de luz e vida do Evangelho foi tocando vários corações humanos. São esses que permitem que a cada ano novamente aconteça o Natal com a sua promessa da vinda do reino dos céus. O reino dos céus não  se estabelece fora, mas em nós. O despertar da criança espírito na alma humana é o Natal de hoje. O Filho, o Cristo nasce na alma humana e traz sua mensagem de paz para a Terra. O barulho das armas, das catástrofes da natureza, dos prantos dos famintos e infelizes querem abafar essa mensagem. Cada um de nós pode ser um portador da luz e da mensagem de paz do Natal. Ela é o verdadeiro consolo e cura de toda a calamidade atual. Sejamos inabaláveis como o autor e filósofo russo Wladimir Solowiof, que disse:

É verdade que inúmeros pecados e crimes terríveis

Ainda ocorreram desde a virada dos tempos.

Mesmo que a consciência, desde então, teve de nos julgar culpados,

O seu fogo sagrado não pode e não irá mais desaparecer.

Pois não foi em vão que a luminosa noite apareceu,

Em que a criança, a quem os anjos servem,

Nesse mundo nasceu

Do Pai, acima do céu estrelado, seu Filho.

Ainda hoje, o mundo, nas suas profundezas sabe,

Que a fonte da verdade e da vida jorrou completamente;

E também soam em luto, em um campo de escombros

Suas palavras – como sinos – soam alto e claro.

O mundo rejeitou a luz que nele nasceu,

Mas ela brilha na consciência como uma tocha na noite.

O regente deste mundo perdeu a sua vitória,

Derrubado pela força do espírito e não pelo poder externo.

Helena Otterspeer

Reflexão para domingo, 10 de dezembro de 2023

À esquerda: Fra Angélico, século XIV. À direita: Ícone russo do século XVIII.

O Evangelho de Lucas, nos seus dois primeiros capítulos, abre-se com as anunciações do nascimento de duas crianças, João Batista e Jesus. A primeira anunciação é feita a Zacarias, ancião sacerdote no templo em Jerusalém, casado com Elisabeth. A segunda, seis meses mais tarde, a Maria, jovem ainda solteira, prometida a José. As duas anunciações são reveladas por um anjo a descendentes sacerdotais de Aarão, mas o restante dos respectivos contextos são bem diversos. A primeira é dirigida ao pai de João Batista, Zacarias, de idade avançada, respeitado sacerdote casado com Elisabeth, também idosa e estéril. A segunda, dirigida a Maria, singela mãe de Jesus, ainda bem jovem e não casada.

O filho de Zacarias, João Batista, “carrega em torno de seu corpo o espírito do Pai” (epístola do Ato de Consagração do Homem na época de João), carrega nobremente o espírito primordial da criação do ser humano à imagem e semelhança de Deus. Ele prepara a vinda do Cristo, nele está representada toda a corrente espiritual do passado convergindo para esse acontecimento principal e único da história da humanidade: a encarnação do Filho de Deus num ser humano, em Jesus, a revelação do espírito no mundo físico-sensorial.

O filho de Maria, Jesus, oferecerá seu envoltório corpóreo ao Cristo, que como Filho do Homem, pela ressurreição, será o primogênito dos que nascerão do reino dos mortos, o primogênito de uma segunda criação, denominado por Paulo como o segundo Adão. Nele reside o germe do futuro.

Passado e futuro se encontram no que dá o profundo sentido à obra do Cristo, a ser revelada pelas palavras do Evangelho.

Nas imagens acima, as asas dos respectivos anjos apontam para um âmbito maior do que o espaço específico do acontecimento histórico: para a porta aberta no templo e para o jardim da morada de Maria, respectivamente. Sobretudo na obra de Fra Angélico, as asas do anjo Gabriel se estendem para o jardim fora da casa, onde no fundo está representado o Querubim expulsando Adão e Eva do paraíso. No processo de concepção de um ser humano somos levados a um âmbito bem além do espaço e do tempo, aos mais remotos primórdios da humanidade, quando pelo Logos, pela palavra divina o ser humano foi criado. Momentos especiais, arquetípicos na evolução da humanidade nos revelam essa verdade: NASCEMOS DE DEUS, do espírito. Assim também foi anunciado o nascimento de Abraão e de seu filho Isaac, quando seus pais já estavam bem idosos. Podemos mesmo contemplar tempos remotos, em que o ser humano ainda não havia se encarnado num corpo próprio, ainda sendo gerado pelos espíritos da Terra (Elohim), vivendo ainda no colo da nossa mãe Terra.

No entanto, as palavras dos anjos na anunciação apontam sobretudo para o futuro.

João Batista vai se colocar completamente a serviço da vinda do Senhor, vai preparar o seu caminho, vai formar o círculo dos discípulos, em cujo meio atuará o Cristo, enfim, vai batizar Jesus.

Jesus vai colocar a sua morada terrena completamente à disposição do espírito do Cristo. O mistério do Gólgota vai poder acontecer na Terra sobretudo graças a esses dois seres, que se sacrificaram por toda a humanidade. MORREMOS EM CRISTO.

Com a ressurreição e a vitória do Eu Sou do Cristo sobre as forças da morte, o ameaçado futuro da humanidade e da Terra se revela como uma estrela guia. Torna-se possível para todo ser humano alcançar novamente sua consciência espiritual perdida, agora numa nova clarividência sem a perda da sua autoconsciência. O acesso à comunidade dos seres divinos faz do ser humano um colaborador na obra divina para sempre.

Depois de uma longa época descendente, em que a consciência espiritual foi se turvando até o mais radical materialismo, o Eu individual agora está desperto. Agora cabe a esse Eu individual, com a força de Cristo, acompanhar no futuro, conscientemente, com as forças do coração a ascendente revelação divina que se abre novamente aos sentidos humanos. Desde a ressurreição, o Cristo vem se manifestando na Terra e agora pode ser acolhido pela alma humana no processo de reintegração na sua pátria espiritual. O futuro imediato do ser humano é o acender dos seus sentidos espirituais numa ligação existencial com o Cristo. Esta é a a esperada vinda do Cristo, ou seja, a sua aparição no mundo etérico. Isso é o que vislumbramos no começo do ano cristão, na época do Avento. Não podemos nos fechar a esse acontecimento, a ponte para a meta futura da humanidade. PELO ESPÍRITO SANTO REVIVEMOS!

Ao nosso redor todas as conturbações nos céus, na natureza, no íntimo da alma, no âmbito social, são os sinais que anunciam o grande acontecimento da nossa época. Se estamos abatidos, sem esperança, nos ergamos com as asas que podem crescer na nossa alma pelo encontro com o Cristo, pelo despertar de uma nova consciência! Isso é o que podemos alcançar juntos em comunidade, na vivência dos sacramentos no novo ano cristão!

Helena Otterspeer

Reflexão para domingo, 19 de novembro

Referente à perícope do Apocalipse de João 21

No começo e no destino do caminho da humanidade há duas grandes imagens. No começo, logo após a criação, é descrito o jardim do Éden. Nele a natureza era perfeita e os primeiros seres humanos, Eva e Adão, viviam sem esforço. Para poder haver desenvolvimento, eles precisavam sair do jardim.

Como meta do caminho, a Apocalipse nos traz a imagem da nova Jerusalém. É descrita uma cidade bem especial, diferente de todas as cidades que conhecemos. A cidade é construída pelo esforço conjunto dos seres humanos e das hierarquias celestiais.

Não podemos voltar para a natureza, para o estado inocente do paraíso. Precisamos continuar o caminho na direção à nova Jerusalém. Devemos nos esforçar e trabalhar para a construção dela. Para isso, precisamos transformar a nós mesmos e também a natureza. Certamente haverá sacrifícios a fazer nesse caminho. Um trabalho árduo nos espera. Cada um guiará as perguntas: Como ajudo na construção da nova Jerusalém? Quais pequenos passos posso fazer para a realização da meta da humanidade? Como posso construir em conjunto com os seres espirituais?

Julian Rögge

Reflexão para domingo, 12 de novembro de 2023

Referente João 7,9-17

João, que recebeu a revelação de Jesus Cristo, encontra-se, certamente, vestido de branco em torno do Cordeiro, pronto para cantar um cântico novo, para que no futuro uma nova Terra e uma nova humanidade desça dos céus.

Ele ainda como Lázaro serviu a Jesus Cristo e a seus discípulos junto com suas irmãs Maria Madalena e Marta. Seguindo fielmente Jesus, aspirou a um caminho espiritual. Foi ressuscitado por Jesus Cristo e se tornou seu discípulo amado Lázaro-João.

Estava como testemunha ao pé da cruz e acolheu, segundo o pedido de Jesus, sua mãe como se fosse o próprio filho.

Com os outros discípulos conviveu com o ressuscitado durante os 40 dias de Páscoa.

Em Pentecostes recebeu em comunidade com os apóstolos o Espírito Santo e pôde entender o significado do feito do Cristo para toda a humanidade. Como descrito no capítulo 5 do Apocalipse, o livro com os sete selos foi aberto pelo Cordeiro, que se sacrificou pela evolução da Terra e da humanidade.

Esse livro também se abriu para João, em seu destino individual. Ele se torna um seguidor de Cristo, sua consciência espiritual vai crescendo, ele atua com presbítero na comunidade de Éfeso. Acolher a verdade em Cristo é um fortalecimento interior, é um impulso vigoroso para servi-lo. Mas mesmo, ainda resta sempre um grande desafio, uma grande prova do destino a ser superada. João é condenado à morte por não querer adorar os deuses romanos. Ele sobrevive à pena de morte e é exilado com 99 anos para a ilha de Patmos.

Nessa prova, nesse caminho de transformação interior, ou seja, nessa iniciação ele vivência como a sua própria natureza interior é Espírito, Espírito que supera as provas. A revelação se abre ao seu olhar espiritual. Sua alma se veste com a veste branca do espírito luz. Outras almas se juntam a ele para uma nova criação.

Onde eu mesmo me encontro?

Helena Otterspeer

Reflexão para Domingo, 29 de outubro de 2023

O Apocalipse de Bamberg (ano 1009), o Filho do Homem entre os sete candelabros.

Quando cristãos se reúnem em memória do feito de amor de Jesus Cristo em prol de toda a humanidade ou, em outras palavras, para tornar a sua presença e atuação reais, então as sete velas no altar são acesas e a consciência espiritual na comunidade está desperta. Nesse espaço anímico-espiritual formado pela consciência humana, Cristo, o ressuscitado, pode agir entre nós e conosco na celebração do Ato de Consagração do Homem e dos outros sacramentos. Assim, transforma trevas em luz, forças de morte em forças de vida. A partir desse centro espiritual, no altar, Cristo acompanha cada um nos seus desafios diários curando, consolando e transformando a civilização e a cultura.

João, o evangelista estava só numa pequena caverna na ilha de Patmos em exílio decretado pelo imperador romano, porque se negara a adorar outros deuses romanos. Com 99 anos estava nesta crise em sua vida, quando no domingo, no dia do Senhor, o dia da ressurreição, ele ouviu uma voz como de trombetas atrás de si e se virou para trás. Virou para o âmbito onde normalmente nada vê e a ele se abriu o véu que normalmente cobre o mundo espiritual. Então, ele vislumbrou o Filho do Homem, vindo das nuvens, como prometido pelo ressuscitado na sua ascensão aos céus. Que consolo poder vivenciar, que apesar de todas as perseguições e influências negativas da época no Império Romano e na humanidade, o Filho do Homem atua nas sete comunidades representadas pelos candelabros acesos. Qualquer outra comunidade cristã estaria representada por uma das sete, segundo as sete fases de desenvolvimento possíveis. Na sua mão estão as sete estrelas, que são os sete anjos das sete comunidades. Os anjos que se ligam a uma comunidade, onde um sacerdote e uma comunidade se dispõem a servir o Cristo na celebração dos sacramentos. Cristo, os anjos e os seres humanos passam a atuar juntos para possibilitar o desenvolvimento do futuro. O futuro depende do ser humano e da sua ligação com o feito de Cristo! Cristo sabe lidar com a espada de dois gumes, que representa o desafio do ser humano de se tornar um ser provido de um eu espiritual, a serviço da obra divina e não dominado pelas forças do egoísmo. Os dois gumes da espada são, por um lado, uma individualidade que serve o espírito com o constante perigo de, por outro lado, ser subjugada pelas forças do egoísmo.

Essa é a anunciada segunda vinda de Cristo, que é vivenciada por cada um individualmente no momento certo da sua jornada na Terra e que vem se multiplicando em vários casos individuais desde o começo do século passado. O apocalipse prepara e fortalece cada um para esse significativo momento, pois “todos os olhos o verão, mesmo os olhos dos que o perfuraram” (Ap.1-7).

O apocalipse é um caminho de iniciação do ser humano. Cada um de nós será chamado numa certa hora a percorrer esse caminho. Haverá, nesse caminho, momentos de extrema graça, consolo e esperança, acompanhados ao mesmo tempo de um profundo abalo em todos os níveis da existência humana, pois a vivência da iniciação é um acordar para uma responsabilidade do ser humano diante do futuro da Terra, de toda a humanidade e da obra dos seres divinos. Nesse caminho está previsto o desafiante confronto com as forças do mal e a sua superação. João cai como morto aos  pés do Cristo, diante da grandiosidade do mundo divino e diante das demandas que isso implica para si mesmo.

A visão do Filho do Homem acontece no momento em que João atinge uma consciência espiritual da sua própria natureza humana, da sua origem divina e da sua meta espiritual. Essa consciência está intimamente ligada ao ser divino do Cristo, do Verbo divino, que na sua visão abrange, como ser humano, desde o Sol até as incandescentes profundezas da Terra, desde a face até os pés do Filho do Homem. A sua veste podendo ser vivenciada como tudo que podemos perceber no mundo sensorial, todos os reinos da natureza, toda a obra divina, como a veste do criador. Toda essa obra em perfeita harmonia e unidade cingida com o cinto de ouro do espírito, que pode conferir a cada momento o sentido superior da pluralidade e variedade da grande obra divina!

Conhecer quem é o ser divino do Cristo e com isso alcançar também uma consciência da própria natureza humana é um grande desafio hoje, pois na maioria das vezes só conseguimos perceber fragmentos da grandiosidade desse ser. João tenta descrever o que vivência com vários conceitos, vários nomes, com os quais podemos apelar pelo Senhor, que também assim se refere a si mesmo! Estes são:

O Filho do Homem

Eu sou o Alpha e o Ômega, o Princípio e o Fim!

O que é, o que era e que há de vir!

O Todo-poderoso.

O Senhor.

Esses nomes não são somente substantivos, mas verbos e também adjetivos! Abarcam espaço e tempo, onde podem se revelar e atuar diferentemente em várias fases da evolução. Seja numa época anterior à criação e ao surgimento do espaço e tempo, como Logos divino – o Logos, a unidade primordial de tudo que posteriormente foi criado! Seja também no princípio da criação e também na meta da evolução, como Filho do Homem. Em Jesus Cristo já se realizou essa meta e ele nos acompanha na aspiração individual, assegurando potencialmente o alcance dessa finalidade. O homem, a sua criação, a sua evolução e o seu futuro estão intimamente ligados ao Senhor, ao Cristo. Portanto esse ser permanece atuante em cada fase da evolução, é nesse sentido Todo-poderoso, porque assegura em si a possibilidade do futuro e da meta espiritual do homem. Podemos a cada ano deixar ecoar esses nomes na nossa alma e assim ir crescendo em Cristo!

Helena Otterspeer

Reflexão para domingo, 23 de julho de 2023

Referente à Marcos 8, 27-28

Poder-se-ia dizer que a pergunta de Jesus Cristo no capítulo 8 do Evangelho de Marcos “e vós que dizeis quem Eu Sou?” encontra-se na metade de todo o texto desse evangelho. Também esta pergunta é central quanto ao significado da incarnação do Filho de Deus em Jesus e também da sua morte e ressurreição para o futuro de toda a humanidade. Com esta pergunta “quem sou Eu?” Jesus Cristo confronta a alma humana com essa mesma indagação, agora consigo mesma! Assim Ele aponta para o imprescindível papel do ser humano para a evolução da  Terra e dos céus!

No ciclo anual das festas cristãs, já cultivamos através da nossa vida religiosa desde o Advento, depoiso Natal, Epifania, Paixão, Ressurreição e Ascensão a memória do mistério de como Deus se tornou homem, morreu, ressuscitou e se ligou para sempre com a Terra. Em Pentecostes as chamas do Espírito baixaram sobre a alma dos seguidores de Cristo,  concedendo-lhes um novo sentido para a verdade, para o conhecimento espiritual, para o conhecimento de si próprio! Nesse momento, poderíamos dizer que alcançamos a metade do ciclo anual das festas cristãs.

Então ouvimos, na época de João, as palavras de João Batista, quando indagado pelos fariseus e escribas quanto à sua legitimação para que pudesse batizar: “Eu não sou!”! Sim, João Batista, que como na epístola da época de João carrega em torno de seu corpo o Espírito do Pai, aponta

para o futuro, para o Filho, para um novo princípio de evolução, que germina no centro da alma humana com esta pergunta:”quem sou Eu?” A alma humana ainda muito ligada à sua condição terrena transitória e corporal não poderia sozinha resolver esse enigma sem se ligar a Jesus Cristo e entender o mistério da ressurreição.

Antes da concretização da incarnação do Filho de Deus em Jesus, a condução da evolução da humanidade acontecia diretamente a partir do mundo divino, que escolhia os profetas, concedia autoridade aos sacerdotes e escribas, anunciava a vinda do Messias, do Cristo! Depois de Pentecostes se estabelece um novo impulso para evolução: o Eu Sou na alma humana. Tudo que antes valia é desvalidado. Trata- se de despertar esta força crística interior da alma humana, sem qualquer apoio das antigas formas e tradições exteriores, a partir do futuro. O futuro do ser humano é a superação da sua condição transitória e mortal e a conquista da vida em espírito, a vida eterna. Para isso a alma humana deverá aprender a encarar no feito do Cristo o modelo ideal da sua própria evolução. Cristo se tornou homem para que o homem possa vir a se tornar um ser divino. Agora, na segunda metade do ciclo anual das festas cristãs é isso que nos orientará.

Constatamos na atualidade, que as estruturas sociais, políticas e econômicas não conseguem mais criar perspectivas para o futuro. A própria vida na Terra está ameaçada. A pergunta que está soando em cada alma humana, está recebendo uma resposta? Estamos indiferentes à urgência desse chamado? O que significa o Cristo para mim, nas minhas decisões, nos meus questionamentos, nas minhas dúvidas? Estou aceitando os desafios, as crises como chance para  o despertar as forças cristicas em mim?

Quem sou eu? Quem é o Cristo? Como eu posso hoje transformar catástrofes em novos impulsos de vida e luz? Como eu posso cada vez mais me elevar ao Espírito reconhecer a verdade, agir segundo ela, em justiça diante do mundo divino e diante da natureza? Estas são as  questões prioritárias hoje! As respostas a elas levam às verdadeiras soluções hoje procuradas!

Helena Otterspeer

Reflexão para domingo, 16 de julho de 2023

Referente ao Evangelho de Mateus 11,2-15

Nesta passagem, João, apesar de sua proclamação anterior de Jesus como o Messias, passa a demonstrar dúvidas sobre isso durante um período difícil de sua vida. Sua missão já se havia cumprido. Ele padecia agora de sua pura condição de um ser humano em sofrimento.

Em resposta, Jesus realiza milagres, curando os enfermos e confortando os aflitos. Ele encoraja os mensageiros de João a testemunhar esses sinais, assegurando-lhes que o Reino de Deus está realmente próximo. Jesus reconhece as dúvidas de João, mas fala bem dele, enfatizando seu papel de mensageiro que preparou o caminho para a a sua vinda. Depois de sua morte seu espírito continuará presente no desenrolar da missão de Cristo. Como precursor do Cristo, ele nos inspira a sermos nós precursores do “Cristo em nós”.

Em nossos tempos difíceis, é natural que tenhamos dúvidas e incertezas, assim como João. Podemos questionar o estado do mundo e nos perguntar se a esperança e a redenção estão ao nosso alcance. No entanto, o Evangelho nos oferece uma mensagem de esperança. Assim como o pôr do sol ilumina o céu com suas cores radiantes, a esperança pode iluminar nossas vidas mesmo nos momentos mais sombrios. A resposta de Jesus às dúvidas de João nos ensina que não há problema em questionar, buscar respostas e lutar com fé. Por meio de suas palavras e ações, Jesus nos assegura que Ele está presente, oferecendo consolo, cura e, por fim, redenção. Que possamos buscar consolo em saber que o Reino de Deus está ao nosso alcance e que, mesmo em nossas dúvidas, há espaço para o crescimento da fé. Confiemos que o plano de Deus para nós se desenrola, trazendo esperança, cura e a promessa de um amanhã melhor.

Carlos Maranhão