Reflexão para o domingo, 27 de abril de 2025

Referente à perícope do Evangelho de João 20, 10-29

No dia da ressureição, o Redentor aparece de diferentes formas aos seus discípulos, incluindo às mulheres. Abre pouco a pouco os sentidos humanos para perceberem a realidade da ressureição, do Jesus Cristo Ressuscitado. As narrativas dos quatro  evangelistas são todas bem diferentes.

Alguns recebem a mensagem da ressureição, ao levantar do sol, quando estavam a caminho do túmulo e o encontram aberto e vazio. A grande pedra que fechava o túmulo havia sido removida, causando grande espanto.

Outros vão vê- lo no final da tarde, em comunidade, quando Ele aparece apesar das portas fechadas no aposento da Última Ceia, mostra suas feridas e confere o novo sopro de vida.

Podemos nos admirar como Ele se manifesta de diversas maneiras. Ele é anunciado na existência dos que já eram seus discípulos e se tornaram as primeiras testemunhas da ressureição, pelo sol nascente, pela pedra removida, pela mensagem dos anjos e, enfim, pela revelação do próprio corpo da ressureição. Esse testemunho é um ponto de mudança crucial nas suas vidas, mas também na vida da humanidade, que a partir de então acolhe o impulso do cristianismo na sua evolução. Podemos constatar nisso uma força crescente da ressureição, uma ligação cada vez mais íntima com a alma humana, com a humanidade e com a Terra. Se estendermos isso aos dias de hoje, poderíamos dizer que com a expansão do impulso do cristianismo, Jesus Cristo Ressuscitado – que nos acompanha até o final dos tempos – pode vir a aparecer a muitas pessoas, segundo a própria configuração de suas almas e vida, em cada caminho individual.

No capítulo 20 do Evangelho de João, lemos que Maria Madalena é a primeira a encontrar o túmulo vazio e, preocupada, comunica o fato a Pedro e João, que então correm até o local, cada um a seu modo. Constatam, então, que os panos de sua mortalha e o véu do seu rosto estão depostos em lugares diferentes. João, o Lázaro ressuscitado,  simplesmente ao ver as faixas da mortalha desenroladas no túmulo já sabe que Ele ressuscitou.

Maria Madalena permanece por um momento no local e ouve, sucessivamente, a mesma pergunta: “Mulher, por que choras?” Primeiro, dos dois anjos posicionados à cabeceira e aos pés do lugar onde Jesus Cristo havia sido deposto; depois, ao se voltar, daquele que inicialmente toma por um jardineiro. Este, além de repetir a pergunta, acrescenta: “A quem procuras?” Ao ouvir sua resposta, Ele a chama pelo nome: “Maria”. Então, ela responde: “Mestre” e o reconhece. Ela, que antes da morte na cruz havia ungido e preparado seu corpo para a ressurreição, e que também permaneceu como testemunha ao pé da cruz, é a primeira a vê-lo sozinha, quando Ele, no jardim do túmulo, pronuncia o seu nome. Ao ser chamada, Maria sente-se reconhecida pelo espírito do Cristo e, com os olhos da alma, é capaz de vê-lo ressuscitado.

Todos esses encontros podem viver nos nossos corações como arquétipos do encontro com Jesus Cristo ressuscitado. Cada alma humana já recebeu anúncios, mensagens desse acontecimento central na história da Terra e da humanidade. Cada alma humana está a caminho de se ligar mais intimamente com a realidade da ressurreição e colaborar na obra divina na Terra. Comunidades que em suas celebrações se reúnem para vivenciar a presença e atuação de Jesus Cristo podem e poderão receber o sopro de vida do Redentor.

As perguntas de Jesus Cristo Ressuscitado ressoam até hoje para cada alma humana: “Por que choras?” e: “A quem procuras?”. O sentido de todo sofrimento se abrirá, quando ouvirmos a voz de Jesus Cristo pronunciar o nosso próprio nome e o reconhecermos como o nosso guia, o nosso mestre em todos os caminhos da vida.

Helena Otterspeer

Reflexão para o domingo, 20 de abril de 2025

Referente à perícope do Evangelho de Marcos 16, 1-18

O túmulo está vazio

O coração está cheio

No domingo de Páscoa, as mulheres encontram o túmulo vazio. O corpo, que elas querem preparar para o sepultamento, não está mais lá. O túmulo está vazio.

Aos poucos elas reconhecem a nova realidade. Elas encontram o Cristo ressuscitado e percebem os seus corações plenos.

Durante a Paixão vivenciamos o vazio. O coração estava frio e abandonado. Ele se tornou um escuro túmulo vazio.

E hoje, no domingo de Páscoa? Percebemos, como as mulheres, a grande mudança, a nova realidade? Reconhecemos que o coração está preenchido por uma nova força? Ouvimos nele o júbilo da ressurreição:

Cristo verdadeiramente ressuscitou!

Julian Rögge

Reflexão para o domingo, 13 de abril de 2025

Referente à perícope do Evangelho de Mateus 21, 1-11

Se as árvores das florestas pudessem se expressar, gritariam: Socorro!

Se as baleias e todos os seres marinhos pudessem falar, clamariam: Socorro!

Se as geleiras polares pudessem manifestar sua dor frente ao derretimento incontrolável , gemeriam: Socorro!

Todos os seres vivos, todos os ecosistemas, todo o mundo dos elementos e seres que nele vivem, sofrem com a contaminação e a devastação que o ser humano lhes causa.

Também entre nós mesmos, certos grupos se outorgam o direito de impor a outros sua vontade pela força bruta, pela opressão, pela ganância perversa.

Como se houvesse justificativa moral para fazer guerra, para explorar, para discriminar! Também aqui se ouve, em muitos lados, o pranto: Socorro!

A quem se dirige este clamor?

Há quem possa ouvi-lo?

No Domingo de Ramos, o povo reunido diante das muralhas de Jerusalém, cansado do jugo dos opressores e colonizadores da ocasião, também gritou: Socorro!

Gritou à sua maneira: Hosana!

Seu clamor se dirigia àquele que vem em nome do Senhor!

Hosana! Socorro! – que essa voz seja escutada e reverbere, também hoje, até o mais alto dos céus!

Sim, assim seja!

Renato Gomes

Reflexão para o domingo, 06 de abril de 2025

A nossa vida pode ser como um rio ou como uma cisterna. Muitas vezes vivemos como uma cisterna, sempre ansiosos para garantir que haja o suficiente para amanhã, sempre temerosos de que nos falte algo essencial.

Mas Cristo nos convida a viver como um rio, recebendo continuamente da fonte inesgotável de Deus. O mundo nos ensina que devemos sempre garantir o amanhã, acumular, nos proteger contra a incerteza. Essa é a raiz da ansiedade humana: o medo de não termos o suficiente. As pessoas que seguiam Jesus após a multiplicação dos pães queriam mais um milagre, mais um sustento para o dia seguinte. Mas Jesus os convida a olhar além da necessidade imediata. Isso significa que não é apenas o futuro que está sendo prometido. O pão da vida não é algo reservado para depois da morte, mas uma realidade que já podemos experimentar agora. Se vivemos em Cristo, se nos alimentamos dele, então não precisamos mais viver dominados pela fome, pelo medo da carência. Viver do Pão da Vida significa que nossa existência já está plena agora. Não precisamos nos alimentar de ansiedades, de inseguranças, de expectativas frustradas. Podemos viver confiando que, assim como o maná caía todos os dias, Deus nos dá tudo o que precisamos hoje. Se estabelecemos uma relação real com Cristo, então nos tornamos como o rio: não precisamos estocar, não precisamos viver de sobras ou migalhas, mas fluímos constantemente, recebendo e dando, porque a fonte que nos alimenta nunca seca.

Carlos Maranhão

Reflexão para o domingo, 30 de março de 2025

Cristo Ressuscitado, de Rembrandt (1606-1669)

Referente à perícope do Evangelho de João 8, 1-11

Uma das maiores forças da alma humana contemporânea é a sua intelectualidade, a capacidade de descrever, diferenciar, analisar e formar juízos e julgamentos. No povo israelita, essa capacidade foi exercitada pelo desafio de compreender e cumprir as leis divinas para o comportamento humano na sociedade.

Hoje, essa capacidade é indispensável para o desenvolvimento das ciências naturais, da técnica e suas aplicações na indústria e comércio. Podemos, por um lado, celebrar e intensificar essa qualidade na prática mas, por outro lado, podemos perceber que ela encerra em si grandes perigos: a análise fria, o calculismo para interesses de poder sobre outros e a falta de qualquer envolvimento emotivo e de promoção do desenvolvimento humano.

Enfim, a tendência de diferenciar, separar e analisar para obter um resultado, quando projetada no contexto social e nas relações entre os povos, pode gerar muitos conflitos, sem que essas forças e métodos possibilitem encontrar soluções pautadas na harmonia, na confiança e na compreensão entre diferentes partidos. Isso corresponde à paisagem das guerras atuais em diferentes locais do mundo e à falta de perspectivas para a paz.

A imagem dessa crise da alma humana é a da mulher adúltera no meio do círculo formado pelos fariseus e escribas para condená-la. Sim, a alma humana havia se separado da vida, do calor e da luz divinas, traíra sua ligação existencial com o espírito. Ela estava ameaçada pelas forças da morte. Nessa configuração, não haveria qualquer outra perspectiva além de sua condenação à morte. No entanto, antes mesmo de ela ser apresentada a Jesus Cristo, Ele, ao raiar do dia, havia se dirigido ao templo, onde as pessoas se reuniram ao seu redor para ouvir suas palavras. Suas palavras são vida, luz e espírito.

Sim, não há somente uma enorme tendência do intelectualismo dominar a maneira de pensar e atuar da humanidade hoje! Também existe um enorme anseio da alma, do coração humano pelas forças constitutivas e formadoras da vida e da paz, que no momento crucial e crítico da humanidade foram trazidas à Terra por Jesus Cristo.

Nenhuma das graves consequências do comportamento humano são apagadas da memória divina. Jesus escreve na Terra os efeitos negativos do comportamento humano. Mas, ao mesmo tempo, Ele acredita na humanidade, se confessa a ela e a estimula a traçar o seu caminho para o futuro, rumo a uma nova ligação com o mundo divino e a uma nova maneira de pensar, capaz de superar as crises e transformá-las em grandes oportunidades de desenvolvimento.

A vida religiosa, a oração, a celebração dos sacramentos é um mergulhar nesse novo âmbito do pensar vivo, da vida e da luz de Cristo, que vão nos conduzir ao raiar de um novo dia! O dia em que do centro da alma humana não mais vai predominar a tendência de crítica e julgamento de outros, mas vai irradiar a devota força crística do amor e da fraternidade, criando novos mundos!

Helena Otterspeer

Reflexão para o domingo, 23 de março de 2025

Referente à perícope do Evangelho de João 6, 1-15

 

A multiplicação dos pães não é apenas uma demonstração do poder divino, mas uma revelação profunda sobre a verdadeira natureza da abundância e sobre como Deus deseja que vivamos nossa relação com os bens deste mundo e com as outras pessoas. A economia tradicional é fundada sobre o princípio da escassez. Desde os primórdios, aprendemos que há recursos limitados e que, para sobreviver, precisamos administrar, competir e acumular. Quem tem o poder de distribuir muitas vezes preserva a abundância para si e deixa apenas as migalhas aos outros. Quem vive na escassez, por sua vez, teme perder o pouco que tem e almeja sempre aquilo que lhe é negado. Essa lógica domina o mundo, mas não o Reino de Deus. No deserto, onde cinco mil homens, além de mulheres e crianças, se reuniram para ouvir Jesus, havia fome e pouca provisão. Mas ali, o Senhor quis nos ensinar um princípio superior. Diante da multidão faminta, Jesus não se deixou dominar pelo medo da escassez. Tomou os poucos pães e peixes que lhe foram oferecidos, deu graças e começou a distribuí-los. E à medida que partia e repartia, a comida se multiplicava. O milagre não aconteceu antes da partilha, mas durante a partilha. Cristo não multiplicou os pães para que cada um acumulasse para si, mas para que todos recebessem o necessário.

Se confiarmos apenas no que vemos e tocamos, viveremos reféns da lógica da falta. Mas se nos abrirmos à realidade espiritual, compreenderemos que Cristo é o verdadeiro administrador da abundância. Ele não apenas reparte o pão material, mas nos dá o Pão da vida. Isso significa que, ligados a Ele, não precisamos temer o futuro, nem cobiçar o que o outro tem. Pois a riqueza que vem de Deus não se mede por bens acumulados, mas pela paz do coração, pela generosidade de espírito e pela confiança de que nunca nos faltará o necessário, quando do coração emana o espírito da verdadeira fraternidade.

 

Carlos Maranhão

Reflexão para Domingo 16 de março de 2025

 

Referente à perícope do Evangelho de Lucas 11, 29-36

Nunca é fácil reconhecer os sinais dos céus, seja o de Jonas em sua época, seja o de Cristo mais tarde. Tínhamos, e temos cada vez mais, a tarefa de desenvolver nossa liberdade e reconhecer, em liberdade, os sinais dos céus.

Não haverá um sinal glorioso ou muito visível. Encontraremos nos céus os sinais mais sutis: em uma vivência no Ato de Consagração do Homem, em uma oração ou no encontro com um ser humano, em uma providência do destino ou depois de passamos por uma crise. Alguns sinais só perceberemos na retrospectiva.

Depende de nós estarmos atentos e reconhecemos os sinais dos céus. O Cristo quer despertar essa atenção em nós. Assim, ele pode se revelar através desses sinais.

Julian Rögge

Reflexão para Domingo, 9 de março

Referente à perícope de Lucas 11, 14-26

“Todo reino dividido, será devastado. Toda casa dividida, cairá!”

A primeira divisão que vivenciamos ao encarnarmos consista na separação: mundo interior x mundo exterior.

Ainda no ventre, também âmbito corpóreo, existe uma íntima conexão entre nosso corpo físico e o organismo materno.

No nascimento esta ligação é cortada. Começamos a nos separar do mundo que nos circunda. Este processo de separação se intensifica durante toda a nossa existência terrena. Estabelece-se cada vez com maior intensidade tal divisão: meu mundo interno x o mundo lá fora. Também poderíamos chamar: “minha casa ou meu reino” x “os reinos deste mundo”.

Numa perspectiva teológica, este fato é consequência da chamado Pecado Original, ou da “saída do Paraíso”.

Na vida pré-natal nossa consciência (ainda que profundamente adormecida), vive em íntima conexão com o Mundo do Espiritual ou com a Casa do Pai.

Para que possamos desenvolver nossa individualidade, precisamos nos separar, nos tornar independentes e autônomos. Disto decorre a divisão, a que Cristo se refere. As forças adversárias se aproveitam desta “brecha” e ampliam cada vez mais tal divisão.

Diante desta situação, o ser humano vivencia um processo de isolamento em relação ao mundo espiritual. Em grego se usava a mesma palavra para significar “deserto” e “isolamento/solidão”.

Quando se diz que todo reino dividido será devastado, numa tradução literal poder-se-ia dizer que “todo reino que se divide, será desertificado, se tornará um deserto”.

Ou seja, a consequência desta divisão primordial, intensificada pelas forças adversárias, conduz o ser humano ao deserto da alma, a desertificação em sua própria casa terrena, em seu próprio reino, no qual ele se percebe solitário e perde a capacidade de se comunicar com o mundo espiritual. No deserto da alma o ser humano emudece em relação ao Espírito!

Quem pode redimir esta divisão, esta separação?

Somente a força que vive no nosso “Eu”.

Apenas nosso “Eu”, o cerne de nossa individualidade, consegue unir estes reinos, transitar entre a nossa casa terrena e a casa do Pai, em comunhão com todos os demais reinos do universo.

No Ato de Consagração do Homem, no início da Comunhão, escutamos as palavras de Cristo, que diz estar em “plena paz com o mundo”. Aqui a “paz com o mundo” aponta para a capacidade de superar esta divisão arquetípica da condição humana. Ser capaz de unir de novo o que foi separada. Vencer o isolamento e a solidão do deserto da alma, para nos conectarmos de novo com o Reino do Espírito, mesmo que continuemos a viver encarnados aqui na Terra. A paz é a condição anímico-espiritual onde as divisões e as divergências são superadas. (Aqui também se abre uma perspectiva interessante, frente às tantas guerras e divisões que observamos na atualidade!)

Esta mesma passagem do Ato de Consagração reforça que é a partir da força do ”Eu”, que se estabelece a paz com o mundo. Cristo nos estimula a encontrarmos em nós esta força, a confiar nela e desenvolvê-la, no sentido das palavras do Evangelho de João (16,33):

“No mundo tendes aflição, conflito, divisão. Tende coragem! “Eu” venci o mundo!”

No “Eu” humano vive a força que vence toda divisão, toda separação, e que nos une de novo ao Espírito.

Renato Gomes

Reflexão para o domingo, 2 de março

Referente à perícope do Evangelho de Mateus 17, 1-9

No mundo terreno, a luz do sol, que tudo ilumina, permite-nos ver o que antes estava envolto em escuridão. Essa imagem é uma metáfora perfeita para o nosso processo de cognição: a luz do espírito ilumina nossa alma, permitindo-nos enxergar o que antes não víamos e compreender o que antes não compreendíamos.
No Evangelho de Mateus, no alto de uma montanha, Pedro, Tiago e João veem algo que até então lhes estava oculto: Cristo transfigurado, seu rosto brilhando como o sol, suas vestes resplandecendo como a luz. Eles já caminhavam com Jesus, já haviam ouvido suas palavras e testemunhado seus milagres, mas ainda não haviam enxergado plenamente quem Ele era. Quando veem Moisés e Elias ao seu lado, Pedro sugere erguer tendas para os três, como se fossem iguais em estatura espiritual. É então que a voz de Deus ressoa, assim como no batismo: “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo; a Ele ouvi!” A visão desaparece, e resta apenas Jesus. Essa experiência não foi uma mera visão gloriosa, mas uma correção da percepção dos discípulos. Moisés e Elias foram servos de Deus, precursores de Jesus Cristo, mas este é a própria plenitude da revelação divina. O que os discípulos viram no monte não era um Jesus diferente, mas o mesmo que já conheciam, agora iluminado pela luz da verdade.
E aqui nos perguntamos: será que também precisamos dessa correção? Vivemos em um tempo onde a fé se dilui entre tantas vozes, onde Cristo é muitas vezes colocado ao lado de outros grandes mestres, como se fosse apenas mais um entre tantos. Pode ser que não o comparemos com Moisés ou Elias, mas talvez o tratemos como um sábio moralista, um líder inspirador, um símbolo entre outros. A transfiguração nos chama a perguntar: vemos Cristo como Ele é, ou apenas como gostaríamos que fosse? No alto da montanha, a luz revelou a verdade. No vale da vida cotidiana, essa revelação precisa transformar nossa visão. Não basta admirar Cristo ou reconhecê-lo como um grande mestre; é preciso ouvi-lo, segui-lo e deixar que sua luz nos ilumine. Pois, no fim, quando todas as outras vozes se dissipam, não vemos mais ninguém, senão Jesus.

Carlos Maranhão

Reflexão para o domingo, 23 de fevereiro

Referente à perícope do Evangelho de Mateus 4, 1-11

Quanto maior a graça, maior a responsabilidade da humanidade em relação ao mundo espiritual. Quanta substância, força e sabedoria o ser humano em sua existência recebeu do mundo espiritual para que se tornasse um ser livre. Muitos ciclos de desenvolvimento, muito tempo se passou até que, na virada dos tempos, a força divina despertou na alma humana.
Nem tudo foi bom nesse desenvolvimento, porque, para se tornar livre, o ser humano teve que separar a sua vida da vida cósmica divina. Foi assim que ele abriu os portões para a atuação do mal, dos seres adversos.
Enfim chegou a hora em que a humanidade deveria tomar o curso do desenvolvimento em suas próprias mãos, a hora de assumir sua própria responsabilidade para o futuro. Para isso, ela teria que enfrentar e superar as forças do mal que até então haviam atuado sobretudo em sua corporalidade, em sua natureza terrena. Em sua alma e espírito o ser humano poderia se tornar livre para superar o mal. Sua natureza anímico-espiritual recém desperta teria que se tornar mais forte do que as exigências puramente físicas, corporais. Mas ela ainda estava muito frágil por dentro.
Foi quando o Pai enviou o Filho ao mundo. O Filho de Deus só conseguiu encontrar uma morada em um ser humano muito especial, para isso preparado. Em Jesus o Filho de Deus encontrou uma morada. O batismo no Jordão pode ser visto como a concepção de um novo ser espiritual, o Filho do Homem, que surgiu pela atuação do Filho de Deus em Jesus, transformando e superando assim sua natureza terrena e transitória.
Depois do batismo, Jesus Cristo foi enviado pelo Espírito para os lugares e situações em que se manifesta o mal. O Filho de Deus pôde superar as tentações, primeiro se confessando a Deus e enfim pelo seu próprio sacrifício na Cruz.
Toda a humanidade pode agora, desde batismo até a ressurreição, testemunhar a transformação da natureza mortal de Jesus, a vitória definitiva sobre o mal e a morte. Assim um germe do espírito foi colocado em cada coração humano, para que seja iluminado pela consciência espiritual individual, para que cresça e evolva. Desde a criação, nenhuma graça maior foi concedida à humanidade!
Essa consciência espiritual vai se formando e se intensificando quando em devoção, na época da Paixão, podemos consumar com Jesus seu ato de sacrifício e amor. A vontade de nos juntarmos a Ele vai crescendo em nós. Nosso coração vai se permeando cada vez mais com sua vida, sua luz e amor. Assim cresce em nós o germe espiritual, a força para, como Ele, aceitar e superar os enormes desafios de nosso tempo. Cresce em nós a disposição para nos confrontarmos com o mal, com os mais profundos e escuros abismos da alma humana para poder levar para lá a luz e a vida da ressureição.

Helena Otterspeer